O que é?
Cometendo o grande pecado do reducionismo extremo que somente um rasante de baixa resolução permite: Blockchain é uma forma de programar. Mais especificamente, fazer um programa que coloque dados dentro de um bloco de informação e assine esse bloco com uma chave, de forma a detectar se ele foi alterado de alguma forma, depois de sua criação.
Isso cria uma assinatura no bloco, que será armazenada no bloco seguinte. Quando o próximo bloco for assinado, registrá qual é o seu bloco imediatamente anterior, formando uma corrente de blocos que não pode ser alterada e pode ser examinada até o primeiro bloco, criando um registro histórico imutável.
Vou poupar vocês dos detalhes técnicos que alguns nerds como eu acham fascinante, mas a maioria das pessoas normais acha um saco. Basta dizer que construir essa cadeia imutável e aparentemente simples envolve uma complexidade tremenda, centenas de algoritmos e milhares de detalhes. Ter o conhecimento técnico, o intelecto e a epifania de colocar tudo isso junto é o mérito de uma pessoa ou grupo de pessoas chamado Satoshi Nakamoto, em 2008. Ninguém sabe ao certo até hoje quem ele é ou são.
Blockchain portanto é a tecnologia e não o seu produto. Pense no motor de combustão interno. Ele não é o carro, nem sequer o motor V6 Series 2 3800 da Buick ou o BMW S54. Esses são produtos que aplicam a tecnologia de combustão interna. Eles não são a combustão interna. Este é o caso de projetos como Bitcoin, Ethereum, Dash mais de 3000 outros. Eles são produtos que derivam do Blockchain.
Porque isso importa?
A tecnologia tornou possível a criação de sistemas descentralizados confiáveis, sem uma autoridade central. O detalhe importante aqui é que não é a autoridade que possui os servidores que é confiável, mas o sistema em si.
Mesmo os proprietários que possuem os servidores de um Blockchain (também conhecidos como Nós ou Nodes), tipicamente não possuem autoridade para derrubar o Blockchain inteiro ou alterar seus dados. Esse poder só pode ser exercido se os nós concordarem e a decisão de mudanças é feita de forma automática. ( Sim, eu sei que existem excessões, mas esse é um rasante, lembra? )
Como um Blockchain possui centenas ou milhares de nós, torna-se virtualmente impossível uma mudança dessa natureza. Quanto mais Nós um Blockchain possui, mais seguro ele é. Quanto mais variados forem os proprietários dos nós, melhor. Isso dificulta que um número significativo deles entre em acordo para alguma ação coordenada.
Para quê serve?
Para construir confiança. Como o registro no Blockchain não pode ser alterado, uma vez que ele seja feito, garante o compromisso que representa.
De forma mais concreta, pense em uma compra. A compra de um carro envolve a troca de propriedade do carro e a troca de propriedade de dinheiro no sentido oposto. Se o carro e o dinheiro forem representados de uma forma digital e essa troca armazenada em um bloco, a qualquer momento é possível verificar no Blockchain se ela realmente ocorreu e quem é o proprietário atual do carro e do dinheiro.
Esse é o princípio atrás das criptomoedas. Cada registro da mudança de mãos delas é registrado no Blockchain, sem a necessidade de instituições centralizadas como, por exemplo, um banco.
Outra vantagem é que quando dinheiro é criado em Blockchain, essa criação obedece regras conhecidas e previsíveis. Dessa forma, a utilização destas moedas evita os problemas decorrentes da emissão em excesso e uma política monetária desastrada.
Isso não significa que não existam outros desafios como a volatilidade da moeda devido as forças de oferta e demanda ou até mesmo a evolução e consolidação da própria tecnologia onde foi desenvolvida.
Um lugar para cada coisa, cada coisa em seu lugar
Uma vez que entendemos que Blockchain é a tecnologia, o que é Bitcoin? É um projeto que usa essa tecnologia, assim como Ethereum, Dash, Cardano, Polkadot e mais alguns milhares deles.
Cada um possui suas próprias características e finalidades. Alguns possuem as mesmas finalidades e os torna concorrentes diretos. Outros procuram resolver problemas diferentes e, portanto, existe espaço para colaboração.
Peguemos três projetos como exemplos:
Bitcoin: é o primeiro que surgiu e portanto, o mais famoso. Seu uso principal é como “reserva de valor”, ou seja, é uma moeda digital. O nome da moeda também é Bitcoin e é comumente chamado de “Ouro Digital”. Em certo ponto de sua história ocorreu uma divergência de visões entre os nós e o Bitcoin se dividiu em dois projetos: Bitcoin (BTN) e Bitcoin Classic (BTC).
Ethereum: é o segundo maior projeto na área e considerado por alguns ainda mais relevante que o próprio Bitcoin. Sua característica mais marcante é permitir a criação de programas em seu Blockchain, chamados Smart Contracts. Ao ser capaz de executar esses Smart Contracts, o Ethereum permite a formalização de relações entre seus utilizadores e a criação de outros produtos, que não somente a moeda que utiliza, chamada Ether.
Dash: o principal objetivo do Dash é servir como meio de pagamento. Criado para acessibilidade inclusive para a parte da população mundial que não tem acesso ao sistema bancário, foca bastante em baixas tarifas por operação.
Wallets
Uma pessoa ou organização é representada no Blockchain por uma Wallet (carteira). Nesta carteira que residem as criptomoedas e é ela que possui poder para interagir com Smart Contracts e enviar ou receber essas criptomoedas.
As próprias carteiras são armazenadas no Blockchain, porém só podem ser acessíveis através de uma senha que a “abre”. Quando ouvimos que alguém teve sua carteira roubada, o que aconteceu é que outra pessoa teve acesso a esta senha, abriu a carteira e transferiu as moedas para outra. Com isso, o proprietário original perdeu completamente o acesso as suas moedas.
É essa senha que pode residir em uma App no seu celular, impressa em um papel ou dentro de um aparelho fabricado especialmente para esse fim.
Garantindo a Relação
Ethereum não é o único que possui capacidade de Smart Contracts, mas com certeza é o mais conhecido e a base para grande parte das aplicações atualmente existentes. Alternativas como EOS, Cardano e Tron também estão trabalhando para apresentar vantagens relevantes em relação aos Smart Contracts do Ethereum.
Estou destacando aqui esta capacidade de executar Smart Contracts porque considero ela a mais importante em um Blockchain. Acumular valor internamente, implementar as regras que todos os envolvidos irão seguir e ainda ser auditado, quando publicado, são capacidades que abrem grandes possibilidades. Com isso, o Smart Contract serve como ponto comum de confiança para que pessoas e organizações que não se conhecem possam fazer negócios com segurança. Essa capacidade reduz custos e permite acesso a negócios que antes eram simplesmente inviáveis para uma parcela significativa das pessoas.
Um Smart Contract em Ethereum não pode ser parado, não pode ser censurado, pode ser auditado e é acessível a qualquer um que possua uma carteira Ethereum. Isso traz um poder enorme aos indivíduos, mas também uma ameaça enorme as instituições como governos e bancos, uma vez que eles perdem o controle sobre os valores que transitam na sociedade. Parte da resistência em aceitar essas novas tecnologias e ceticismo por parte de analistas estabelecidos a muito tempo deriva do desafio de repensar nossas instituições para que possuam um relacionamento saudável com essa tecnologia.
Próximos Passos
Acho que está bom: já soterrei você com mais informação que você poderia consumir rapidamente.
O mundo do Blockchain é imenso e complexo. Existe muito a aprender e vários níveis de entendimento possível. É importante que você se aprofunde até o ponto que é razoável para os seus objetivos.
Prosseguirei com essa série, aprofundando conceitos conforme for necessário. Os próximos assuntos que sugiro que se informe, conforme seu perfil e interesse, são:
- Executivos: Aplicações e Usos do Blockchain;
- Programadores: Como preparar o ambiente local para desenvolvimento de Smart Contracts em Ethereum;
Sinta-se a vontade para comentar, compartilhar, discordar, curtir ou praguejar. Como toda tecnologia nova, todos nós temos muito o que aprender. É mais fácil e produtivo quando o fazemos juntos.
(Sumário) - (Próximo)
By Jim Bruno Goldberg